sexta-feira, 16 de outubro de 2009

PARA REFLETIR

A CPI do MST e as terras roubadas


A terra é o mais grave problema de nossa história social, desde que os reis de Portugal retalharam uma geografia do País, com uma concessão de sesmarias aos fidalgos. Os pobres não tiveram acesso pleno e jurídico à Terra, a não ser nos 28 anos entre uma Independência - quando foi abolido das sesmarias o regime - e 1850, quando os grandes proprietários impuseram a Lei de Terras pela qual, como glebas devolutas podiam ser só adquiridas do Estado em dinheiro.

A legislação atual vem sendo sabotada desde que foi aprovado o Estatuto da Terra. É fácil condenar a violência cometida, em episódios isolados, e alguns muito suspeitos, pelos militantes do MST. Difícil tem sido uma punição dos seus líderes que matam os pequenos e os que defendem.

Nos últimos anos, segundo o MST, mais de 1,6 mil trabalhadores rurais foram assassinados e apenas 80 mandantes e executores chegaram aos tribunais. Em lugar de uma CPI para investigar as atividades daquele movimento, seria melhor para uma sociedade nacional que se discutisse, um fundo, uma questão agrária no Brasil.

O Censo de 2006, citado pelo MST, revela que 15 mil proprietários detêm 98 milhões de hectares, e 1% deles controla 46% das terras cultiváveis. Muitas dessas glebas foram griladas. Temos um caso atualíssimo, no interior de São Paulo, onde terras da União estão ocupadas ilegalmente por uma das maiores empresas cultivadoras de cítricos do Brasil. O Incra está em luta, na Justiça, a fim de recuperar sua posse. O que ocorre ali, ocorre em todo País, com uma cumplicidade, remunerada pelo suborno, de tabeliães e de políticos.

Cinco séculos antes de Cristo, os legisladores já se preocupavam com a questão social e sua relação com a terra da Posse. É conhecida a reforma empreendida por Sólon, o grande legislador, na Grécia, que, com firmeza, mandou quebrar os horoi, ou marcas delimitadoras das glebas dos oligarcas.

Mais ou menos na mesma época, em 486, AC, Spurio Cássio, um nobre romano, fez aprovar sua lei agrária, que mandava medir como glebas de domínio público e separar parte para o Tesouro do Estado e parte para aos pobres ser distribuída. Imediatamente os nobres se sublevaram Como um homem só, e até mesmo os plebeus enriquecidos (ou seja uma alienada classe média daquele tempo) a eles se somaram.

Spurio Cássio, como Theodor Mommsen em conta sua História de Roma, foi Levado à morte. "A sua lei foi sepultada com ele, mas o seu espectro, a partir de então, arrostava incessantemente a memória dos ricos e, sem descanso, eles contra Surgia, até que, pela luta continuada, uma República se desfez" - conclui Mommsen.

E com razão: a última e mais completa lei agrária romana foi um dos irmãos Graco, Tibério e Caio, ambos mortos pelos aristocratas descontentes com sua ação dos pobres em favor. Assim, a República se foi dissolvendo nas guerras sociais, até que um liquidou Augusto, ao se fazer Imperador, conduziram e seus sucessores uma grande decadência da experiência histórica.

Não há democracia sem que haja reforma agrária. A posse da terra familiar - e da casa, na situação urbana - é o primeiro ato de cidadania, ou seja, de soberania. Essa posse vincula o homem e sua família à terra, à natureza e à vida. Sem lar, sem uma parcela de terra na qual o senhor seja Relativamente, desgarrado é o homem, nômade sem lugar nas sociedades sedentárias.

É impossível ao MST estabelecer critérios rígidos de ação, tendo em vista a diversidade regional e a situação de luta, caso a caso. Outro ponto fraco é uma permeabilidade natural aos agentes provocadores infiltrados e repressão da especial, ou da Polícia submetida ao poder econômico local.

No caso da fazenda da Cutrale em Iaras são muitas as suspeitas de provocadores que tenham agido. É improvável que os invasores tenham um chamado, um fim de documentar uma imprensa derrubada das Laranjeiras - sabendo-se que isso colocaria uma opinião pública contra o movimento.

Repete-se, de certa forma, o que houve, há meses, no Pará, em uma propriedade do banqueiro Daniel Dantas.

E necessária uma criação de força-tarefa, composta de membros do Ministério Público e agentes da Polícia Federal que promova, em todo o país, devassa nos cartórios e Anule escrituras fraudulentas.

No Maranhão, quiseram vender à Vale do Rio Doce (então estatal), glebas extensas. A escritura estava registrada em 1890, redigido em livro e assinado com caneta esferográfica - inventada depois de 1940.

Mauro Santayana (Jornalista. Publicado originalmente no Jornal do Brasil)

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